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O ANALISTA É UM FILHO DA ESCUTA

Coloque-se naquela situação em que você tinha total razão sobre determinada coisa. Não é sua imaginação, é fato. Mas você foi injustiçado. Então, você tenta uma conversa, tenta uma interlocução. Mas não consegue que o lado de lá dê uma atenção. Multiplique isso por horas, por dias, por meses... Não há dúvidas de que isso pode ser altamente explosivo.


Escuta

Quando você está tentando falar com alguém e esse alguém não está ali para lhe escutar pode ser bem complicado. Sendo que – lembre-se – você está supondo estabelecer uma defesa sobre algo que você considera explicitamente injusto, algo que fizeram com você e você não esperava, você não imaginava. Quantas vezes somos colocados em situações em que o contexto é refratário, opaco ou simplesmente não é aquele que nos permite interagir. E nossa razão tem razão de ser, pois dentro de nossa subjetividade, de nossa íntima verdade, nós temos a certeza de que ela é absoluta. Porém, infelizmente a prática soberbamente demonstra que ela não o é, simplesmente ignorando-a. Dá vontade de gritar, de arrancar as calças pela cabeça, como se o mundo tivesse virado de cabeça para baixo. E o corpo todo é tomado pela urgência de ser escutado.


Saber da injustiça e não ter interlocução. Ter razão mas não servir de nada. O que fazer numa situação como essa? Sair por aí como um paladino da verdade? É exatamente nessa hora que você deve entender que precisa entrar o analista.


É nessa hora que o analista percebe que precisa testemunhar e ser capaz de sustentar a angústia desse paciente. Ele está desamparado e isso interessa imensamente ao psicanalista.


O psicanalista não é funcionário público, não é um atendente, não é um justiceiro, não é um juiz, não é um médico. É um psicanalista. E qual a sua função? É justamente o oposto do que faz o atendente da loja, o advogado, o passante na rua, o sujeito na fila do banco, o marido em casa, os filhos, o robô da ouvidoria, o chefe, o leitor do blogue e o amigo do bar. 


A escuta põe em suspensão, em espera, qualquer conclusão, qualquer certeza. Porque a chamada indignação tem algo a dizer e não irá se calar. E mais: a pessoa tomada por ela está se sentido lesada, subtraída, afanada, e ela precisa, no mínimo, dizer isso – e para alguém que escute (mas escute mesmo, que saiba ouvi-lo; e isso não é tão simples). 


Quando você não tem a oportunidade de falar, de conversar, você tem acesso a uma zona obscura, uma zona que tende a descalibrar a sua emoção. Haverá, a partir daí, uma escalada. Uma escalada porque não encontra interlocução. E uma pessoa, quando não encontra interlocução, ela pode encontrar a tragédia, ela pode encontrar o horror. Enfim: perder - literal e figurativamente - a razão.


Equipe Psicanálise Descolada

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